03 – Vitoriosos

 

Erik tocou Fausto e se tele transportou para longe da batalha, o mais longe que seu corpo ainda poderia ir. Reapareceu perto do barco que os levou até lá, faltava pouco para o amanhecer e fausto precisaria de um local para se esconder.

- Vamos até a cidade, consigo fazer isso uma vez mais, e de lá farei um feitiço que nos deixará em São Paulo de imediato, to preocupado pra cacete com minha irmã.

- Um feitiço desse vai te matar e me deixar perdido por ai, não vamos embora dessa forma, justamente por estar preocupado com minha Ângela é que não vou arriscar esse tipo transporte.

Faustu jamais consideraria um caminho que o afastasse de Ângela permanentemente.

- Não se preocupe comigo coroa – disse Erik segurando novamente Faustu para tele transportarem – Sou muito mais poderoso do que os bruxinhos que vê por ai.

Desaparecerem da beira do rio e reapareceram num beco próximo ao aeroporto, Erik estava branco, praticamente sem Vitae no próprio corpo. Respirava com dificuldade e cambaleava enquanto seguia em direção a rua. Parou no beco e ficou ali, passando mal, um humano comum que passava ofereceu-se para ajudar.

- Amigo, está tudo bem?

- Sim, estou – disse Erik – Só preciso descansar um pouco.

Faustu ficou escondido nas sombras esperando Erik fazer, seja lá o que fosse.

- Quer uma ajuda, posso de levar até o aeroporto, lá eles tem uma enfermaria.

- Tudo bem, só me de uma mãozinha.

O rapaz, de uns vinte e poucos anos, se aproximou para ajudar Erik e assim que o tocou caiu de joelhos, Erik recitava em voz baixa um feitiço enquanto trazia o corpo, já inerte, do jovem para dentro do beco.

- Faustu – O vampiro deixou as sombras – “Vambora”.

- O que vai fazer?

- Vou pra casa e você? – Faustu ficou calado por um instante - Ele pagará o tributo do feitiço e fará o feitiço de acordo com meu comando. O feitiço não terá todo o poder que deveria ter, mas será o bastante pra nos deixar em minha casa.

O jovem levantou-se de súbito, olhos brancos e uma expressão doentia no rosto, tremia e falava baixo com o nada.  Erik estendeu as mãos em sua direção. O jovem levou o dedo indicador a boca e começou a morder até que o arrancasse, sangue começou a jorrar enquanto ele desenhava no chão um triangulo com dois símbolos no interior e três do lado de fora, um para cada ponta, ao final fez um circulo que envolveu todo o símbolo.

Erik entrou no circulo e virou-se para Faustu que estava um tanto incomodado em se envolver com algo que não conhece. O bruxo deu-lhe um olhar de censura e antes que dissesse algo Faustu entrou.

O jovem enfeitiçado começou a falar numa língua que o vampiro desconhecia, a língua dos infernais, seu corpo começou a se decompor, pele derretendo, olhos se desfazendo e o braço direito caiu. Quando terminou de proclamar o feitiço seu corpo estava todo coberto de sangue e Faustu e Erik desapareceram.

Assim que eles sumiram o corpo do garoto entrou em combustão, ele gritava em agonia descomunal, a vida abandonando seu corpo rapidamente, não durou muito, o feitiço usado por Erik para transpassar distância tão grande consumia a vida rapidamente, em menos de um minuto apenas um amontoado de carne queimada e pútrida jazia no chão.

Erik reabriu os olhos já em sua casa, o dia nascendo, Faustu foi para o quarto do rapaz e fechou a porta. Do escuro do quarto do rapaz ele falou.

- Tem como confirmar a segurança de sua irmã antes de descansar?

- Caramba coroa, estou quase morto aqui – Fez-se silêncio e pode-se ouvir o bater de pés irritado de Faustu – Ok, eu dou um jeito. Erik foi resmungando até o espelho que ficava na sala, fitou-o enquanto recitava um encantamento, como tinha pouca vitae ia fazer o básico, olhar o local onde Ângela foi deixada descansando pra ver se estava tudo bem. Alguns segundos depois de iniciar o encantamento ele pode ver o quarto onde ela estava, deitada numa cama, o sol entrando por uma abertura na janela, viu a silhueta de um homem ao lado da cama, seu coração acelerou enquanto ele já pensava em tele transportar para lá, mas pôde reconhecer o fulano, era capacho de Faustu, um moleque franzino com cara de doente, estava com uma espada de prata nas mãos cuidando de Ângela para seu mestre.

- Está tudo bem, seu moleque está lá, cuidando dela como se fosse a coisa mais importante do mundo. Onde você arrumou um cara desses coroa?

- Não é da sua conta. Obrigado, vou descansar agora.

Erik sorriu olhou para o sofá e lá se jogou pouco antes da arrumadeira abrir a porta e entrar em seu apartamento.

A arrumadeira, acostumada com a bebedeira do rapaz, iniciou seu trabalho como de costume, porém a porta do quarto de Erik estava trancada então ela deixou este cômodo de lado. Terminou de arrumar as coisas por volta das oito da manha e ia saindo quando Erik despertou, não que estivesse descansado, mas estava faminto e o cheiro de café novinho e pão de queijo estava ganhando espaço, a moça deixara tudo pronto.

Erik levantou e devorou os pães de queijo enquanto tomava café com leite, ficou uns dez minutos apenas mastigando e bebendo e por fim estava estufado.

Foi até seu quarto e viu que a porta estava trancada.

- Abre a porta Faustu, sou eu.

Não houve resposta.

- Coroa, sem essa, quero minha cama.

Ainda sem resposta, Erik forçou a porta algumas vezes, queria sua cama, quase cedeu a tentação de quebrar a porta, mas o sol ia cozinhar Faustu e eles ainda tinham tarefas, por fim desistiu de ir ao seu quarto, foi até o sofá e deitou, precisava muito de uma semana, pelo menos, de descanso.

Assim que adormeceu teve terríveis sonhos onde Ângela estava prisioneira de infernais enquanto ele mesmo estava sob custódia de celestes e ele descobriu, mesmo em sonho, que os celestes sabem ser tão cruéis e terríveis quanto os infernais foram em sua estadia por lá.

Ficou nesse estado por um período que lhe pareceram eras sem fim, sofrendo e vendo sua amada irmã sofrendo também. Quando finalmente conseguiu se livrar do limbo e despertou, já era noite, não sabia se do dia em que retornara ou de um outro dia qualquer, a porta de seu quarto estava aberta.

Levantou-se e foi até lá, esquecendo-se inicialmente de seus dons, Faustu não estava por perto, forçou a percepção e nada encontrou.

- Coroa sem vergonha, deve ter ido pegar minha irmã. - Pensou. Deu uma olhada em seu celular e percebeu que estava sem bateria, olhou o telefone fixo e havia uma luz piscando, indicando que havia mensagens em sua caixa postal.

Acionou o botão e deixou os recados passando.

No geral tratava-se de reuniões da empresa que foram remarcadas por conta de seu sumiço, olhou no visor do telefone e fez as contas, dormiu por dois dias inteiros, o que explicava bem a fome que sentia, e alguns recados de velhos amigos convidando pra baladas e reclamando do celular desligado.

Estranhamente não havia um único recado acerca de Ângela estar sumida a tantos dias, era como se ele tivesse sido apagada da existência, o feitiço que usou retirado do Livro de Liath era realmente poderoso.

Havia um recado de Faustu dizendo que estava tudo bem com Ângela e que até agora não havia sinal de celestes ou infernais por perto.

Olhou mais uma vez o visor do telefone, eram pouco mais de nove horas da noite, resolveu tomar um banho, algo que não fazia já a alguns dias, e ir jantar num restaurante qualquer. Deixou o celular carregando e foi tomar banho, levou cerca de uma hora entre tomar banho, beliscar algo na cozinha e se arrumar para sair.

Pegou o celular, ligou e partiu para uma churrascaria, ia enfiar o pé na lama hoje.

 

 

Faustu estava sedento, ficou imóvel concentrando todas as forças em conter a sede de sangue. A empregada por fim foi embora e logo depois ouviu as batidas de Erik na porta, seu estomago revirou, os olhos acenderam-se e os dentes ficaram expostos, o rosto se contorceu em uma expressão assassina e doentia, encolheu-se no chão do quarto abraçando as pernas e concentrando-se ainda mais, se abrisse a porta e desse de cara com o bruxo talvez não resistisse e ia dar merda, Avalon disse pra trabalharem juntos, fazê-lo de refeição não parecia boa ideia.

O sono diurno o ajudou a controlar a sede e finalmente adormeceu. Quando despertou com o por do sol, estava mais faminto que nunca, nem arriscou ir a sala onde o ronco de Erik impedia-o de ouvir qualquer outra coisa. Foi ate a varanda do quarto e olhou em volta, apurou os sentidos, dois andares acima havia um rapaz sozinho em casa. Soltou um som gutural, como um predador em plena caça e saltou para o beiral da varanda, deu um novo salto para a varanda do andar acima e depois para o outro, os vidros da varanda deste apartamento estavam abertos – facilitam demais para nós – pensou Faustu, ouviu o som do chuveiro ligado, sua presa estava no banho, seguiu sorrateiro e silencioso até a porta entre aberta e a ultrapassou, o box estava todo embaçado dado o calor, mas era possível perceber a silhueta de um jovem forte e saudável, Faustu mal podia conter a vontade de lhe drenar toda a existência, mas não podia chamar atenção naquele lugar, forçou seus poderes psíquicos o máximo que pode e “desligou” o humano que ali estava, este caiu de joelhos e por fim tombou a cabeça de lado.

Faustu não precisava de muito, ao menos não ali, beberia o suficiente para se fortalecer e seguir para um local de caça mais adequada e por fim iria visitar sua Ângela.

Foi até o jovem, cortou-lhe o pulso com uma de suas unhas e sorveu mais ou menos um litro num gole de pouco mais de trinta segundos. Respirou fundo sentindo o bom gosto chegar-lhe as veias e sentindo a vida se aproximando dele ao passo que o desejo de matar de uma vez esse humano quase o dominara, respirou fundo mantendo o controle e resistiu, lambeu a ferida que se fechou numa pequena cicatriz.

Levantou-se e saiu do banheiro seguindo em direção a varanda. Saltou para o solo numa e incrível queda livre, aterrissou como um gato que salta um pequeno degrau.

Seguiu em direção a portaria do condomínio e saiu sem maiores complicações, sua moto tinha ficado no hotel em que esteve hospedado nas ultimas semanas em São Paulo, não muito longe de onde estava agora, mas antes de ir para lá precisava se alimentar adequadamente.

As redondezas do condomínio onde Erik mora são bem desertas na parte da noite, a pouca movimentação que existe se dá pelas padarias que funcionam na região tendo em vista que a maioria dos locais nos quarteirões vizinhos é residencial. Seguiu pelas ruas até se afastar o bastante do local de onde vinha, algumas pessoas passavam a pé, mas nem desconfiavam do risco que corriam, do inimigo natural que ali estava.

Caminhou por cerca de vinte minutos até encontrar uma residência pequena espremida entre diversas outras, provavelmente uma casa de idosos e seria dispensada de imediato não fosse o fato de ter brinquedos espalhados pelo quintal. Faustu apertou o cadeado até que este se partiu, forçou o portão que não resistiu a sua força também e seguiu em direção a porta, fez tão pouco barulho que ninguém na rua ou nas casas vizinhas ouviu algo que os alarmasse.

O vampiro sentiu os odores no ar, havia três pessoas na casa, uma senhora, uma moça e um pequeno garoto. O garoto estava no andar superior, aparentemente dormindo, a mulher estava na cozinha e a idosa devia estar no banho, Faustu não conseguia sentir bem o seu cheiro.

A porta de acesso a casa dava na sala, passando um pequeno corredor que abrigava uma dispensa e um banheiro, se chagava a cozinha, Faustu girou a maçaneta na porta da sala, estava destrancada, seu instinto animal tomou conta da situação, ele seguiu tão veloz para a sala que a mulher não viu absolutamente nada, em menos de um minuto o vampiro já havia drenado todo o sangue de seu corpo.

Levantou sentindo-se mais vivo!

Seguiu para o andar superior e encontrou o garoto acordado na ponta da escada, o menino congelou ao ver Faustu, a criança devia ter no máximo cinco anos, o vampiro estendeu a mão para ele, segurou-o pela garganta e forçou um pouco, o garoto sufocava pendurado pelo pescoço enquanto Faustu caminhava tranquilamente até onde o odor da velha o levava. Quando chegou ao quarto ela estava indo deitar-se, olhou horrorizada para o menino agonizando nas mãos do invasor, e ameaçou gritar, mas era tarde pra isso, o vampiro deu-lhe uma bofetada que a levou a inconsciência. Fez um corte em seu pulso e bebeu todo o sangue, deixou apenas um pouco escorrer pela cama.

O menino já não tinha mais forças, Faustu o trouxe até próximo de seus olhos e permitiu que ele visse o brilho escarlate , lágrimas de terror escorreram dos olhos do garoto.

- Era isso que eu queria – disse baixinho no ouvido da criança – o medo misturado a seu sangue!

Faustu abocanhou o pescoço do garoto e sorveu dois goles pequenos, coisa de meio litro, o garoto desfaleceu.

- Cresça e aprenda sobre o que se esconde nas sombras, transforme-se nas sombras e venha me procurar, gosto de inimigos fortes, você tem potencial e agora um motivo.

O vampiro cravou essas palavras na mente do garoto, fundo o bastante para que ele nunca se esquecesse de quem matou sua família e do terror que se esconde nas trevas.

Ele deixou a casa restabelecido, alimentado e poderoso como sempre foi, agora a coisa mais importante em sua existência tinha toda a sua atenção, Ângela.

Fausto se deslocou como uma motocicleta em velocidade alucinante em meio as ruas de São Paulo, saltava pelos carros e desviava por um triz de veículos que vinham em sua direção, um borrão incompreensível aos olhos humanos que simplesmente pensavam estar vendo coisas. Levou cerca de meia hora para chegar ao local onde deixaram Ângela sob proteção, o feitiço que lançaram sobre ela a deixava num estado automático, ela passava o dia acordada, comia e fazia suas necessidades, nada mais e dormia durante a noite.

Assim que chegou testou a segurança do local, a infusão de ervas ainda pairava no ar, não havia um único demônio ou anjo em volta do local o que indicava que os símbolos de proteção surtiam efeito, os guardas foram instruídos a refazer diariamente os símbolos usando seu próprio sangue.

Chegou aos portões da casa de Ângela e antes de entrar verificou a caixa de correspondência, seja o que fosse que o bruxo fez era poderoso, passou-se quase uma semana e não havia uma única carta no local, realmente era impossível se encontrar a casa caso não fosse permitido por quem fez o feitiço, era de se esperar que ao menos o correio continuasse a chegar, mas nem isso conseguiu.

Faustu tocou a grade do portão e de imediato sentiu a mão arder, o feitiço contra vampiros também estava ativado. Pegou o celular nas mãos e ligou para seu lacaio, o garoto que um dia seria seu filho. O garoto nem atendeu a ligação, só se deslocou para a entrada da casa e, armado com duas mini metralhadoras, abriu os portões.

- Bem vindo mestre.

Faustu apenas fez um aceno de cabeça e seguiu para a casa.

- Creio eu que o bruxo ainda mantenha ativo o circulo de proteção da casa, talvez o senhor não consiga entrar.

O vampiro tentou entrar e não conseguiu, sorriu aliviado, o maldito bruxo tinha talento.

- Acorde-a com cuidado e lhe diga para me convidar.

O jovem correu para dentro da casa e acordou Ângela com um cuidado de quem toca um bebe recém nascido, ela despertou, um tanto tonta e muito sonolenta.

- Diga, “Entre Faustu”

Ângela piscou algumas vezes e por fim disse o que o jovem pediu, imediatamente ela voltou a dormir.

O garoto a deitou com cuidado e virou-se a tempo de ver os olhos e a expressão assassina no rosto de Faustu.

- Mestre, jamais a tocaria, ela lhe pertence como mulher como eu lhe pertenço como filho. – Disse jogando-se de joelhos no chão.

Faustu olhou aquela criatura devota por alguns instantes tentando acalmar o ciúmes doentio, o que lhe custou muita força de vontade.

- Vá dispensar os outros guardas, ficaremos apenas você e eu.

O Jovem saiu da casa falando no rádio e dispensando os outros.

Faustu ficou parado como uma estátua, sem respirar, sem sangue correndo nas veias, sem o bater do coração, não piscava, imponente, imóvel e aparentemente indestrutível como uma estátua, mas ali, deitada na cama estava a única coisa no mundo capaz de desarmá-lo, de revelar sua face humana, por assim dizer, um homem com desejos e vontades, com sonhos até, um homem capaz de tudo para defender sua mulher.

Não se deu conta, mas passou duas horas apenas admirando o rosto de Ângela, tranquilo e sereno durante o sono, ouviu um som na sala, sua mente lhe dizia que era seu lacaio, revendo a segurança. Pegou o celular e ligou para o “cunhado” o pensamento lhe fazia sentir ainda mais humano, estava ficando mole.

Deu caixa postal então ele deixou um recado para Erik informando que estava tudo em com sua amada.

Foi até a sala e lá estava seu futuro pupilo, rondou sua mente e teve que reprimir o “quê” de surpresa, ele dispensou os guardas e quando estavam fora da propriedade ativou um dispositivo que havia sido instalado por ele nos rádios de comunicação, um veneno letal foi liberado, com certeza estavam todos mortos. Ele estava monitorando as chamadas da polícia e já havia confirmado a morte de três dos quatros seguranças, neste momento novamente o rádio da polícia chamou e a morte do quarto foi confirmada. Respirou fundo e se afastou, com as submetralhadoras pesando sobre o corpo.

- Está feito – Pensou – Ninguém além de mim sabe da casa de Ângela, minha senhora e dona, se meu mestre permitir.

Fausto manteve-se em silêncio e de repente o jovem jogou-se no chão, rolou para o lado e apontou as metralhadoras exatamente para onde Faustu estava, ao perceber que tratava-se de seu mestre respirou fundo, trazendo o batimento cardíaco de volta ao normal e levantou-se.

- Sua senhora e dona? O que quer dizer com isso?

O jovem ficou um tanto desconsertado, ele firme e decidido, queria a vida de um vampiro, mas sempre titubeava na presença de seu mestre.

- Se me permite a sinceridade e a verdade que sempre lhe dirigi, vou falar o que cada palavra realmente quer dizer. – Ficou em silêncio por um instante olhando para seu mestre.

- Meu silêncio é sua deixa moleque.

O jovem ficou ainda mais nervoso e desesperado para não errar.

- Está claro para mim que o senhor a deseja, que quer dela algo além da carne e do desejo, quer que ela seja verdadeiramente seu amor...se é este o caso então não me sobra mais nada a não ser entregar a ela tudo que entreguei a você, ela passa a ser junto de ti motivo de minha existência, tanto agora quanto quando me tornar digno de ser seu filho...farei eternamente o que estiver a meu alcance para proteger a ti e a minha futura mãe.

- Não vou transformá-la. – Faustu disse decidido.

- Eu jamais pensaria algo assim, conheço o senhor a dez anos, dediquei minha vida a ser como você, agir como você e pensar como você, para que um dia eu seja realmente como você, para que um dia eu tenha o orgulho de lhe chamar meu senhor ou meu pai, como quiser. Conheço o bastante pra saber que está com ela, pois a ama. – Fez uma pausa organizando as ideias.

- Não sei como isso funciona para um vampiro, mas sinto que essa é a verdade, e o que é importante para ti, é importante para mim.

Terminou de falar e ficou olhando para os próprios pés, encabulado, nunca falara tanto tempo com seu mestre e estava com medo de que ele o dispensasse pelo que havia feito.

Ele vem treinando Bujinkan Budo Taijutsu à tempos, estuda e lê tudo que pode sobre estratégias de guerra e sobrevivência, e toda vez que o mestre lhe mandou ficar longe do covil aproveitou para viver sem regalias em meio as florestas, é um soldado autodidata e um dos bons, todos os testes que já fez na vida depois da decisão que tomou foram de alto nível e ele obteve altas notas, Faustu nem sonhava com isso até agora, olhando o garoto enquanto ele pensa em tudo que já fez e tudo que está disposto a fazer se deu conta que está na hora de decidir se este garoto será seu filho ou não.

- Vou me retirar mestre, não vou mais atrapalhar sua noite.

Fez um reverencia e caminhou em direção a porta, colocou a mão sobre a maçaneta e antes de sair olhou para Faustu mais uma vez.

- Estou em sua mão mestre, e nas mãos da sua senhora, se precisar de mim estarei onde estive nos últimos dez anos, ao seu lado pronto para lhe servir.

- Por que matou os guardas, poderíamos usá-los no futuro.

- Eram um risco para sua identidade e a do bruxo, um risco alto para Ângela, se um de seus inimigos rastreia e captura um deles a vida de todos vocês está em perigo, não me darei ao luxo de correr este risco.

- Acha que algum humano pode vir contra mim?

- Humano? Jamais! Mas sua irritação me fez pensar que talvez estivesse em um trabalho que não queria estar, provavelmente gente poderosa lhe pedindo ou cobrando favores, não posso deixar de pensar que o inimigo é forte, o senhor ter voltado inteiro prova que está acima no nível do inimigo, ao menos é assim que vejo as coisas, mas isso não quer dizer que posso correr riscos desnecessários.

- Sente remorso pelas vidas que tirou?

- Um ladrão, dois assassinos profissionais e um ex-guerrilheiro que é um pouco dos dois, não bastasse isso todos passaram todos os dias olhando para Ângela como se fosse um prêmio, olhos amaldiçoados e desejosos, quis matá-los todos os dias, mas o senhor me deu uma tarefa e eu não julguei que sozinho pudesse cumpri-la, não sei o que o bruxo fez e tão pouco a extensão de seus poderes, não podia esperar que fosse tão bom quanto se mostrou.

Faustu ficou em silêncio e o rapaz saiu da casa e ficou de guarda no quintal.

 

 

Avalon voltou ao inferno empolgado com o ultimo feito. Ele e Lúcifer sentiam e sabiam que o momento era este e que faltava pouco para a batalha decisiva entre céu e inferno.

Os generais estavam exaustos, praticamente sem forças para lutar, mas vivos e haviam causado tanto dano nos Arcanjos que podiam se dar ao luxo de declarar vitória.

- Meus queridos – Disse Lúcifer de forma afetada – hoje conquistamos a ultima peça de nosso quebra cabeça, conseguimos o numero exato de filhos de meu pai com poder divino para colocar em prática meus planos que já duram milênios no tempo dos homens e dezenas de milhares de anos em nosso tempo.

Urras e gritos de fúria reverberaram por todo o inferno, pois Lúcifer falava a todos ali, naquele local ele tinha poder para isso.

- Hoje trouxemos um portal que tem mais poder do que todos os outros, acreditem, ela partilha da essência de um dos arcanjos, um de meus amados irmãos e será uma peça melhor do que eu poderia esperar!

Terminou a frase praticamente gritando, tamanha a sua excitação e foi seguido por todo o inferno.

- Dei a meu Pai um ano para se preparar, um ano terreno, ou seja, ainda temos muito tempo para preparar nosso caminho, temos dezoito mil anos na verdade, para preparar o caminho, para fortalecer nossas legiões e tomar dos céus o que nos foi tirado!

O infernou chegou a tremer tamanha a explosão de poder espiritual que anjos negros e demônios liberaram. Sangue jorrou do chão e na terra quase uma dúzia de vulcões entrou em erupção, o inferno não fica exatamente abaixo da terra, seria impossível um espaço praticamente sem fim caber dentro de um planeta pequeno como este, mas ele sofre com as variações de expansão espiritual, como já foi dito, é um dos motivos dos arcanjos serem proibidos de vir a terra sem que seus poderes sejam selados.

Lúcifer olhou para Ana que ainda estava desacordada, olhou para os vampiros que a trouxeram e, como estava de bom humor, resolveu presenteá-los.

- Yago e Will venham a mim.

Os vampiros encolheram-se com o medo absoluto entrando em seus ossos. Lúcifer sorriu malicioso.

- Vocês não tem com o que me pagar pelo que farei a vocês agora, mas ainda sim eu farei, e o que peço a vocês é que causem pânico e dor nos filhos amados de meu pai, busquem os que servem a Deus.

A Estrela da Manhã fechou os olhos e quando os reabriu havia fogo! Juntou as mãos falando na língua dos infernais e foi separando-as e dando lugar a uma grande foice, Avalon fez o mesmo, seguiu as palavras de seu mestre e foi conjurando a foice junto com ele, Lúcifer o olhava um tanto surpreso, mas ao mesmo tempo era possível notar o “que” de felicidade, da certeza de que escolhera bem seu braço direito.

A foice que Lúcifer conjurou era de aproximadamente cinco metros da ponta do cabo até o inicio da lâmina, esta por sua vez tinha três metros, era negra como o espaço sem fim. A foice conjurada por Avalon era bem menor, cerca de três metros de comprimento e tinha dois metros de lâmina.

Avalon mantinha os olhos fechados, como se estivesse conectado a Lúcifer passou a fazer exatamente os mesmos movimentos, foram aproximando-se um de cada vampiro, que jazia trêmulo no chão, e por fim cravaram as foices no corpo de cada um, atravessando na região do abdômen. Os vampiros gritaram em agonia insuportável, sentiam a carne sendo dilacerada milhares de vezes, Will, que fora atingido por Lúcifer, parecia sofrer menos, não importa o tipo de ataque que Avalon faça, o desespero segue seu ataque e a mente do inimigo fica em estado anormal de agonia e dor.

Gritaram até que começasse a sair sangue de suas gargantas, sangue causado pela gritaria e não pela hemorragia interna, nesse ponto, quando pareciam que iam colocar os órgãos internos para fora pela garganta eles desmaiaram. Avalon e Lúcifer tiraram as foices do corpo dos vampiros e as foices desapareceram.

Avalon sorriu.

- Linhagem do sangue em vampiros tão novos?! Lúcifer, tu és realmente um ser sem precedentes, não pensei que o corpo deles iria resistir a algo assim.

- Ainda tenho muito a te ensinar irmão, agora leve-os para a superfície, permita que se alimentem e ensine os primeiros benefícios do que fizemos. Que eles compreendam o quanto nos devem e causem aos filhos de meu Pai o mal que merecem.

Avalon assentiu, tomou um vampiro em cada mão e voou em direção aos portões do inferno. Deu apenas uma olhada em Baltazar, que viu toda a cena um tanto assustado, e este o seguiu, Baltazar abriria o portal do inferno e faria o feitiço da ponte, só assim eles voltariam com segurança para a terra e lá causariam o terror que Lúcifer lhes ordenou.

Assim que Avalon chegou a terra com os vampiros pendurados pelos braços eles despertaram, famintos e selvagens quase entraram em fúria e destruíram um ao outro, mas antes que conseguissem se tocar, Avalon deu um soco descomunal no rosto de cada um jogando um para cada lado.

- Calma crianças, meu senhor tem planos para os dois, não posso deixar que um de vocês morra agora.

Will e Yago grunhiam agitados a fome quase consumindo novamente a razão.

- Fiquem aqui, vou trazer dois humanos para vocês, se eu voltar e não estiverem aqui, ou um de vocês estiver morto, farei com que passem um ano inteiro no inferno, aprendendo na base da tortura o significado de Autocontrole, não são mais meros vampiros, o que meu mestre e eu fizemos a vocês hoje lhes colocou num novo patamar.

Terminou de dizer essas coisas e desapareceu.

- Will, você está sentindo? O que eles fizeram conosco?

Will ficou em silêncio por um tempo.

- Não sei o que é isso, me sinto mais amaldiçoado do que nunca, mas sinto que não há mais nada na terra capaz de me parar, esses caras são perigosos.

- Também estou me sentindo assim, não sei o que posso fazer, ou o que está em mim agora, mas a verdade é que é mais poder do que jamais vi em alguém da nossa laia.

Ficaram novamente em silêncio, tentando entender o que estava havendo com seus corpos. Avalon retornou poucos minutos depois, dois rapazes estavam com cara de bobos, babando enquanto andavam.

- Não haverá o prazer da caça hoje, sei bem que vampiros preferem assim, mas isso vocês buscam depois, alimentem-se e vamos conversar.

Os vampiros atiraram-se em ataque frenético contra os humanos, rapidamente todo o sangue no corpo de cada um deles fora drenado e os vampiros sentiam-se vivos mais uma vez.

Levantaram-se e juntos viraram-se para Avalon, colocaram o joelho direito no chão e a mão esquerda em punho fechado, portando-se como verdadeiros soldados de um rei. Avalon sorriu.

- Vejo que sentem o que fizemos por vocês, e sim, muito mais pode ser feito com o tempo e serviços bem prestados.

Os vampiros mantiveram-se em silêncio.

 - Vou ensinar a vocês o básico do que agora podem fazer, o resto vocês vão aprender sozinhos, a linhagem que eu e meu senhor colocamos em vocês exige além do sangue humano, sangue vampírico e eu recomendo a vocês que procurem anciões, pois a partir de agora, tudo que eles sabem vocês também saberão.

Will e Yago levantaram a cabeça com um sorriso demoníaco no rosto, nunca mais seriam tratados como moleques pelos velhotes que mandavam nas cidades.