07 - Artes das Trevas
Aléxia olhou-se no espelho a fim de verificar o efeito da calça de cintura baixa marcando seu corpo esguio, assistido ainda por um piercing no umbigo e uma mini blusa com decote em "V" que deixava seus seios a mostra. Fazia tempo que não sai para se divertir e as necessidades do corpo começavam a incomodar, queria "amar" essa noite.
Era uma menina mulher muito atraente. Loira de cabelos cacheados e sedosos, coisa rara nesses dias de “chapinhas”, olho castanho bem claro e um tanto puxados rosto fino como o de uma princesa, com as maças rosadas e salientes, os lábios grossos e apetitosos, olhar sexy e provocante e ainda sim inocente, uma verdadeira “menininha” presa no corpo de uma baita mulher. Quem via as curvas perigosas e a malicia no olhar diria que tem aproximadamente vinte anos. Deu uma ultima olhada no espelho feliz com o resultado e consultou o relógio, eram 23:45 queria chegar ao centro da cidade até a meia noite, estava adiantada, mas tudo bem, daria tempo de escolher um cara atraente para lhe satisfazer os desejos.
Abriu uma gaveta na estante onde se encontrava o espelho e apanhou um punhal, girou entre os dedos segurou com a mão direita e fez um pequeno corte na ponta do dedo indicador da mão direita, levou a gota de sangue até os lábios, sorveu um pouco, olhou a frente e fez uma Runa no ar enquanto recitava um encantamento:
"Ianuae Magicae"
Fechou os olhos por um momento enquanto o quarto de sua casa se transformava num borrão disforme e era substituído pelo novo cenário, quando reabriu os olhos estava num beco sem saída. Olhou ao redor e viu um mendigo olhando para ela com cara de bobo e olhos arregalados. Caminhou em sua direção enquanto seus olhos se tornavam vivos como o fogo, abaixou de forma que seu rosto ficasse a centímetros do rosto do mendigo que estava ainda mais bobo com mulher tão exuberante se aproximando dele sem fazer feições de asco. Aléxia soprou em sua direção e desenhou nova runa enquanto pronunciava um feitiço:
"Carnem et sanguinem, animam damnari.
Utrum voluntas servo loop sanguinis.
Curse faciunt!"
O homem sentiu um hálito gostoso chegar ao seu rosto, fechou os olhos por um momento, então sentiu dor excruciante enquanto a magia do tempo consumia sua vida, enquanto anos atravessavam seu corpo e ele envelhecia, cabelos brancos que em segundos deram lugar a uma cabeça careca, enquanto o corpo entrava em estado de decomposição. Pele apodrecendo e revelando músculos castigados pelo tempo, músculos sendo destruídos por larvas, começando a secar até virar pó, em segundos apenas o pó e roupas velhas estavam no local. Aléxia sorriu e se colocou de pé, olhou em volta, não havia mais ninguém lá, tomou a direção da saída do beco e começou a andar pelo centro da cidade.
Havia muita movimentação nesse ponto da cidade, muitos "inferninhos" abertos deixando a galera gótica se divertir. Foi em direção a um que ela sabia ser frequentado por pessoas com mais grana e, no geral, mais atraente e obtuso o bastante pra sair de um lugar estranho na companhia de pessoas que nunca viram antes. A fachada do local tinha iluminação fraca, proveniente de um letreiro em neon com o nome da balada “Os Portões” e o emblema, que retratava um portão fechado com duas foices guardando a entrada.
Havia uma fila que seguia por cordas de proteção que também serviam pra demarcar a passagem pela entrada, cruzando o portal somente com a apresentação do ingresso e revista pelos seguranças, um pequeno rapaz caracterizado com o vestuário gótico convencional, ficava ao lado dos seguranças com uma lista, provavelmente VIP. Aléxia caminhou em direção a entrada, passando por todos na fila, algumas meninas exclamaram em protesto e foram devidamente ignoradas. Os seguranças sorriram e o pequeno rapaz arregalou os olhos quando ela estava chegando, ele adiantou-se e abriu passagem, suor escorria de sua testa, não ousou olhar nos olhos da mulher, alguns começaram a protestar, mas ele a exemplo de Aléxia simplesmente não deu atenção.
- Boa noite Tom, olhe para mim - Disse Aléxia com sarcasmo.
- Minha senhora, não sou digno - o homem começara a tremer.
- Sei que não é, mas me parece estar com mais medo que respeito.
Os lábios dela não se moveram, mas ele ouviu cada palavra.
- Por favor Aléxia, temos muitos jovens essa noite, muitos para lhe servir como desejar.
- Oh, sim, obrigado, fico feliz, te vejo na saída - Disse ela animada. O homem não pronunciou uma única palavra e lutou contra o pensamento de que não queria vê-la na hora de sair, sabia que se ela saísse de mau humor poderia ser ele a pagar o pato.
A loira cruzou os “Portões” e se viu num corredor estreito onde algumas pessoas conversavam e “trocavam caricias”, duas belas jovens estavam um tanto animadas enquanto suas mãos corriam desenfreadas nos corpos uma da outra, passou por elas com um sorriso malicioso, o lugar parecia quente esta noite. Terminou de cruzar o corredor e chegou ao ambiente comum, um grande salão que estava realmente apinhado de pessoas, a iluminação neste recinto era fraca, quase não existia e ela precisou esperar os olhos acostumarem-se com o ambiente antes de prosseguir, olhou em volta, rostos conhecidos e desconhecidos aos montes, realmente estava cheio demais essa noite. Seguiu em direção ao Bar e a meio caminho um homem pequeno se adiantou e tentou abraçá-la, ela olhou em seus olhos e um brilho rubro passou por ele, o homem ficou com cara de bobo, estacado onde estava, então ela prosseguiu.
O bar era bem longo, cobrindo quase que toda a parede sul da balada, haviam vários atendentes e assim que Aléxia se acomodou, um deles veio atende-la.
- Vodka e energético, por favor - O barman pegou o pedido e olhou em volta.
- E ai Aléxia, o que veio fazer aqui essa noite?
- Necessidades meu caro, quero me divertir.
- Posso ajudar? - Disse isso e se aproximou mais da mulher.
- Infelizmente não, você já teve sua chance lembra? Não me impressionou o bastante para eu querer repetir.
O homem se distanciou um pouco enfezado enquanto ela sentava no banco e dava uma boa olhada no salão. Passados alguns instantes um rapaz veio ao bar, era alto, corpo musculoso, moreno de olhos verdes, muito bonito para alguém que curte esse lugar, pensou ela, e na verdade não estava bem ajustado aos padrões dali, pois ao contrário dos outros que usavam roupa escura e com conotações góticas, esse estava de jeans e camiseta pólo branca, realmente se destacava, com certeza veio apenas acompanhando amigos. Pediu cerveja ao barman e ia se retirar quando esbarrou em Aléxia, olhou um pouco para baixo a fim de se desculpar e encontrou os olhos de Aléxia, verdes como os seus.
- Me desculpe, está tudo bem? - Perguntou o rapaz.
- Sim, nada que uma bebida não resolva.
Aléxia olhava fixamente nos olhos do rapaz, sorria como uma garotinha esperando pelo príncipe.
- E porque não, espere um instante, vou levar isso pro meu camarada e já volto.
Terminou de dizer isso e saiu, passados alguns minutos retornou.
- Bom te ver esperando.
- Achei que valeria a pena - Disse Aléxia em tom de interesse.
- O que quer beber?
- Nada, já bebi o bastante, só precisava de uma desculpa para te manter por aqui.
- Mas se não posso te pagar uma bebida o que mais me faria ficar aqu...
Antes que terminasse a frase, Aléxia se adiantou, envolveu seus braços no rapaz e lhe beijou, com paixão além da compreensão. Como se esse fosse o homem de sua vida, como se nada no mundo fosse tão bom quanto estar ali, beijou-o como se fosse o único homem em toda a existência que merecia seu beijo e ele retribuiu o beijo com a mesma intensidade, com a mesma paixão. Ficaram ali por mais alguns minutos, trocando olhares e beijos.
- Acho que já podemos ir para outro lugar, o que você acha? - Perguntou o rapaz.
- Achei que não fosse perguntar, tão educado você. Onde quer me levar?
- Não sei, moro sozinho, se você não se importa.
- O que me garante que não é um psicopata querendo arrancar minha pele?
- Poderia dizer o mesmo de você, mas com um lábio tão gostoso como esse prefiro pensar que é apenas um daqueles dias de sorte onde a diversão é garantida pela falta de compromisso – Fez uma pausa olhando nos olhos de Aléxia – Isso é ruim pra você?
- Claro que não, será perfeito.
Beijaram-se novamente e deixaram o bar para trás, sob o olhar carrancudo do barman e do sorriso malicioso de alguns transeuntes. Cruzaram o corredor a passos largos, e passaram pela entrada, onde Tom, agora aliviado, ficou para trás. O rapaz a tomou pela mão e conduziu ao outro lado da rua onde ficava um estacionamento, parou na guarita de entrada e entregou o ticket ao atendente, pagou o valor acordado e pegou as chaves do carro, seguindo até onde havia deixado o mesmo. Aléxia o seguiu de perto até chegarem a uma Tucson preta, acionou o botão de alarme do carro e as portas destravaram.
- Belo carro – Disse Aléxia fingindo interesse.
- Obrigado – Respondeu o rapaz alegremente, deu a volta e abriu a porta dela - Vamos entre, minha casa não é longe. - Aléxia sorriu e entrou no carro, ele deu a volta e entrou também.
Saíram de lá e atravessaram algumas avenidas até chegar a vinte e três de maio, seguiram por ela por alguns minutos até chegar a Av. Washington Luís, seguiram até o Jardim Aeroporto, entraram em uma rua e ele diminuiu a velocidade.
- É aqui, nesse prédio - Do outro lado da rua um condomínio de granfinos, cheio de jardins e torres imponentes.
- Uau – disse – Parece um ótimo lugar para se morar. - O rapaz sorriu e beijou a loira mais uma vez, e enquanto beijavam-se um evento estranho se passou. As luzes da entrada do prédio se apagaram, uma espécie de fumaça negra e espessa começou a se desprender do chão, um cheiro forte tomou conta do carro e toda a iluminação da rua falhou até se apagar. Aléxia sabia do que se tratava, olhou para o rapaz que assistia a cena com olhos arregalados, desenhou uma Runa no ar recitando baixinho o feitiço:
"Corporum et vires"
Invocou força descomunal e deu uma cotovelada no rosto do rapaz que desmaiou de imediato. Ela trocou de lugar com o rapaz deu partida no veículo e tomou o caminho de sua casa, quando estavam passando por uma rua escura, encostou o carro, desligou o motor, abraçou o rapaz recitando o feitiço de tele transporte, fechou os olhos e desapareceu, quando abriu os olhos estava novamente em sua casa, na sala de estar.
Ficou em silêncio por um instante usando sua percepção e conseguiu distinguir uma presença sufocante na casa. Jogou o rapaz de lado, desenhou uma runa no ar e recitou um encantamento maldito que dava vida as coisas inanimadas:
"Vitae Vopungo"
Cordas que mais pareciam pedaços de pele se desprenderam das paredes e amarraram o rapaz, ela procurou manter a calma, seu coração não estava ajudando, respirou fundo algumas vezes e foi em direção a cozinha. Quando entrou no recinto seu pulmão foi invadido pelo cheiro forte de enxofre, a luz estava desligada e ela sabia que não adiantava tentar ligar então permitiu que seus olhos emitissem um brilho rubro, próprio dos malditos que selaram "O Contrato" com um demônio. Não que gostasse do que ia ver, mas considerando a situação ver o que ali estava lhe daria alguma chance de sobreviver. Assim que seus olhos iluminaram um pouco o cômodo, pode ver a sua frente, parado e ereto, o Anjo Negro conhecido como Avalon, suas feições, como de costume não eram amigáveis, era belo, sem duvidas, mas a encarnação da maldade.
- Boa noite meu senhor, em que posso servi-lo - Falou isso prostrando-se e baixando os olhos ao chão.
- Levante-se Aléxia, não gosto de servos medrosos, sabe disso.
Aléxia se colocou de pé, olhou para o demônio a sua frente e tentou sustentar desafio em seus olhos.
- Assim esta melhor, seu contrato não é comigo e sua alma não me pertence, mas é bom ver que meu nome não é motivo de chacotas. Venho lhe avisar sobre um trabalho que terá que fazer – Aléxia fez menção de falar algo, mas desistiu, Avalon prosseguiu - Isso mesmo terá que fazer, não estou lhe dando a opção de recusar, ou você faz ou eu mesmo levo sua alma comigo e te mostro o motivo de temer o inferno.
- Falando com tanta delicadeza fica difícil recusar meu senhor.
Disse isso mais asperamente do que pretendia e sentiu-se sufocar enquanto o Anjo Negro se dirigia a ela. Aléxia caiu sobre os joelhos e colocou as mãos no chão arfando, sufocando, o Anjo Negro sorriu por um instante sentindo o aroma do desespero que a humana expelia, segurou seu queixo e murmurou.
"Kratuintch no Malefactu”.
- Por favor....arf..arf...arf... me desculpe...arf.....farei o que me pedir...arf....por favor.
Aléxia via-se presa numa fornalha, fogo consumia seu corpo bem devagar enquanto ela gritava e se debatia invocando seus dons murmurando encantamentos e mais encantamentos, desenhando runas em sua mente, tentando fazer a tortura cessar. Ficou alguns minutos nesse terror. O fogo consumia seu corpo de todas as direções, sua pele avermelhava, começava a criar bolhas e estas cresciam e estouravam jorrando sangue e gritos de dor, as bolhas deram lugar a uma pele enegrecida que em pouco tempo transformou-se em carvão desprendendo-se do corpo em lascas, os músculos desfizeram-se, o sangue fervendo, e ela não morria. Passava por todo o processo, sentia cada músculo sendo torrado, até que os ossos começaram a ser expostos, o cheiro era insuportável. Sua consciência oscilava, mas não a abandonava e quando as forças estavam para deixar seu corpo, quando ela não conseguia mais gritar, inerente a dor que sentia, seu corpo era reconstruído e todo o evento voltou a ocorrer, uma, duas, cinco, dez, cem vezes e por mais centenas, e a dor nunca diminuía, o sofrimento nunca era menor, a agonia era sempre a mesma, sempre acompanhada do gritos, lágrimas e o desejo de que a morte a abraçasse, foi mais uma vez reconstruída e sentiu o chão sob seus pés, não sentia mais o calor, apenas o frio do chão, abriu os olhos e se viu novamente na cozinha de sua casa, olhou a frente para o Anjo Negro que estava olhando os utensílios que tinha e sentiu o medo quando ele virou-se para ela como se nada tivesse acontecido.
- Sim eu sei que fará - Disse Avalon, como se a conversa entre ambos não tivesse sofrido interrupção - por hora quero que se prepare, você é uma das feiticeiras mais poderosas nessa região, sei que pode fazer muito, mas a missão que lhe encarrego não admite erro, você precisa de mais. Sinto a alma de um humano saudável em sua cozinha, pode começar a fazer os ritos do sangue, não sabemos ainda quando vamos atacar, mas será em breve, então seja rápida.
Aléxia levantou a cabeça a fim de concordar e percebeu que a luz da cozinha estava acesa e que estava sozinha. Buscou apoio no armário de cozinha, esbarrando nos utensílios e fazendo estardalhaço quando os derrubou, por fim conseguiu se colocar de pé, estava exausta, usou muito poder para tentar sair da prisão em que o demônio a jogara. Ainda sentia o cheiro de sua pele queimando, ainda sentia o fogo consumindo sua carne e ainda sentia o medo de uma eternidade de tortura e sofrimento. Com esforço conseguiu continuar de pé, cruzou a cozinha até o corredor onde estava o rapaz, ia amarrá-lo e dormir, com certeza seria um sono bem longo.
Eram exatamente dezessete horas quando o homem de pele morena despertou. O quarto tinha iluminação baixa proporcionada pela janela que, mesmo fechada, permitia a passagem de alguma luz. Abriu os olhos, mas não se levantou, ficou ali tentando reconhecer o local, olhou em volta e nada lhe era familiar, uma mesinha, a porta suja e corroída, o lustre imundo, nada disso lembrava sua casa. Tentou se lembrar de onde esteve durante a noite, lembrava-se de entrar em uma balada agitada no centro da cidade, de encontrar uma mulher absolutamente linda, quase irreal, lembrava-se de seu beijo, doce, quente, assim como seu corpo, lembrava-se de sair com ela e entrar no carro, tinha quase certeza de chegar em frente ao condomínio onde morava e a partir daí não tinha mais nada...pensando nisso percebeu com sua cabeça estava dolorida, fora golpeado.
Tentou se levantar, porém, era impossível, estava preso por uma corda grossa, tentou chamar por socorro, mas sua boca não se abriu e uma dor terrível inundou sua mente. Não conseguia abrir a boca, tentou passar a língua e seu desespero cresceu exponencialmente, havia algo costurando sua boca e seus sentidos foram minados. Estava a ponto de desmaiar quando o som de passos do lado de fora da porta chegou a seus ouvidos, ele se forçou a ficar acordado, se tinha alguma chance de entender o que estava havendo, e de sobreviver a isso, seria acordado.
Apurou os ouvidos e estreitou os olhos. A maçaneta da porta se mexeu, girou e a porta se abriu, uma pessoa entrava com os olhos fixos nele, uma vela ao lado da cama se acendeu ao movimento das mãos de quem entrava e ele pode ver a mulher com quem ficara na noite passada. Seus olhos estavam negros como a escuridão, ela não parecia estar andando, parecia flutuar enquanto atravessava o cômodo em que estavam, parou de frente para homem amarrado na cama.
- Eu não pretendia machucar você, só queria “amar” se é que me entende, faz tempo que não consigo diversão, mas um probleminha surgiu e eu tive que mudar os planos, infelizmente para você, preciso do seu sangue garanhão.
Terminou a frase e exibiu um sorriso sinistro de gelar o coração, o rapaz passou a respirar rápido então ela lhe aplicou um soco no estômago que o levou a inconsciência.
Aléxia acendeu a luz do porão, a cama em que eles estavam ficava na parede oposta a entrada, do lado direito uma mesa pequena e ao lado esquerdo uma prateleira com potes etiquetados, ela se dirigiu até as prateleiras e passou a analisar os potes, em alguns vidros haviam membros de animais, e alguns de seres humanos, em outros algum tipo de pó ou farofa feita de ossos ou algo do tipo. Ao lado da prateleira havia uma geladeira, ela foi até lá e abriu como quem está procurando o que comer, porém o que havia ali era repugnante e grotesco. Olhos, vísceras, corações, rins, línguas, e potes com nada mais nada menos que sangue, ela terminou de avaliar a geladeira, fechou a porta e se dirigiu a mesa, abriu uma gaveta e retirou um grosso livro um tanto empoeirado e com aparência de milênios. A capa do livro era coberta por inscrições e o livro estava atado por um cinto feito de pele humana, esta pele tinha algumas tatuagens e cicatrizes que também representavam inscrições antigas, runas malévolas.
Pegou uma pequena adaga que também estava dentro da gaveta e foi até o rapaz, cortou seu pulso e levou até sua boca, sorveu um pouco do liquido passou a mão sobre o ferimento que se fechou com uma cicatriz horrenda, foi até o centro do porão fechou os olhos e pronuncio um nome em voz baixa repetidas vezes.
- "Baal Zelon" " Baal Zelon"
Enquanto pronunciava o nome caia de joelhos. Após alguns segundos o efeito já conhecido pela mulher passou a se desenrolar. As luzes falharam até quase apagar, penumbra tomou conta do local junto com o cheiro acre de enxofre o ambiente tornou-se pesado e sufocante a medida que as sombras perdiam espaço a escuridão profunda. Da parede oposta a cama, surgiu uma criatura infernal, um demônio, alto, forte, pele de aparência jurássica, grossa, cheio de verrugas, músculos expostos, uma espada presa a cintura, asas de morcego que lhe caiam como uma capa, olhos vermelho vivo, praticamente rubis de sangue e ódio. Suas mãos eram dotadas de garras de puro aço, andava em direção a mulher que estava de joelhos, sentia o cheiro da maldade misturado ao sangue humano que ela ingeriu, sentia o medo e isso lhe dava impulso, parou a pouco mais de um metro da garota.
- Porque me incomoda criança, cansou de viver e vai entregar sua alma a mim?
- Ainda não meu Baal, mas preciso dos seus favores, preciso de força, Avalon veio ter comigo.
- Avalon? O que ele queria contigo? – O Demônio fitou-a empertigado.
- Pensei que meu senhor pudesse me dizer isso, não tenho força para arrancar nada de alguém como ele.
- Sim, de fato você não tem, mas não fui informado sobre nada, o que ele lhe disse?
- Que precisaria de mim para uma batalha, que sabia que eu não pertencia a ele, mas que precisava que eu me preparasse.
- Entendo, quando voltar hei de procurar por Avalon e saber o que está havendo, todavia, se ele quer te ver forte devo fazer algo a respeito, o que temos em mãos, além deste homem?
- Tudo o que precisamos meu senhor, nada nos falta, gostaria de tentar algo novo meu senhor.
Foi até a mesa ao lado da cama e pegou o livro, voltando-se ao demônio e seguiu em sua direção, parou a mais ou menos um metro de distância, ajoelhou-se, e com a adaga desenhou um pentagrama no chão. Depositou o livro no centro do pentagrama, cortou a ponta do dedo com a adaga e deixou que uma gota caísse na linha do pentagrama, depois deixou que uma gota caísse na tira do livro e ainda outra na capa do livro e recitou um encantamento numa língua estranha que mais pareciam maldições.
Lilith, uruk no malefactu, kuina et aoul magicae y malefa
In tsuo ruman, obrigo a Liber at castigo q revulus tsuos sekretali
O pentagrama queimou num fogo vermelho e a tira de couro se desprendeu do livro sibilando e lambendo fogo e sangue, tornando-se vermelho vivo. As inscrições em torno do livro ganharam vida, movendo-se para lá e para cá afastando-se de uma pequena trava final que impedia a abertura do livro, esta trava se desfez e o livro se abriu. Aléxia tocou o livro e seu corpo estremeceu, assim que retirou a mão da capa o livro se auto folheou parando numa pagina em que havia um desenho de um demônio abraçando um humano que estava torturando um segundo humano com uma poça de sangue em volta. Aléxia olhou nos olhos de seu Baal e sorriu.
- Sim, sim, é um bom truque, - Disse Zelon - mas será que está pronta para aceitar as consequências disso? Conhece o tormento que esse truque causa, minha cara? Não, você não conhece, não poderia conhecer, pois ainda não visitou meu amo, mas vamos fazê-lo, primeiro convença aquele garoto a entregar a alma a mim por sua liberdade, depois o mate, assim que eu retirar a alma dele, vamos usar para fazer valer seu truque.
- Sim senhor, farei como me diz, chamarei novamente em no máximo dois dias.
- Esteja pronta para a tormenta criança, conseguir esse poder será um teste e tanto.
Zelon desapareceu e a luz retornou ao recinto, Aléxia se colocou de pé e caminhou até a mesinha, guardou a adaga e saiu do porão, ficar na presença de seu mestre lhe custava muito poder, precisava descansar um pouco, mais tarde iniciaria a tortura de seu convidado, precisava convencê-lo de que vender a alma ao diabo era sua melhor chance.